Quão tênue é a linha entre persistência e teimosia?
- Ana Luísa Vahl Dias
- 23 de jun. de 2023
- 3 min de leitura
Atualizado: 19 de jul. de 2024
A gente não tem o poder que acha que tem. Na verdade, temos bem menos poder do que acreditamos ter. Não temos poder sobre a opinião do outro, nem sobre o resultado de uma tempestade e, às vezes, não temos poder nem sobre nós mesmos caso existam influências externas e traumas suficientes para fazer com que o autoconhecimento não seja uma prioridade.

Somos moldados pela crença de que é preciso persistir até a última gota de energia para atingir bons resultados num suposto final almejado, sobre o qual não possuímos nem uma ínfima ideia da imagem que o forma e quando chegará.
De fato, muitas vezes o que dita o sucesso é a capacidade de não desistir na primeira dificuldade, mas entre persistir por algo realmente valioso e não desistir de algo prejudicial por pura teimosia há uma linha muito tênue.
Saber diferenciar teimosia de persistência não é algo natural porque também não é natural ter autoconhecimento como prioridade.
A teimosia é um sentimento altamente enganador: ela traz a ânsia de continuar defendendo o mesmo ponto, de perseguir o mesmo objetivo como se não houvesse nada além disso, mesmo tendo indícios de que não se chegará a um lugar bom no final. A persistência está diretamente conectada a um objetivo especial, que traz real significado para a nossa caminhada e alimenta a coragem de seguir em frente.
Nossa sociedade carrega em si uma fé irracional no arquétipo do salvador: enviados divinos que, por esforço e resistência, salvariam a vida de todos ao seu redor. Crença comum que tem sua origem na cultura católica, base da sociedade moderna, e se estende para todas as nossas percepções individuais.
Somos ensinados - e acreditamos - que possuímos poder suficiente para realizar feitos que não dependem só da nossa vontade. Mudar a opinião das pessoas, convencer uma empresa estruturada de que a gestão existente é ruim, remover a dor alheia. Situações que precisam de compreensão e absorção de todos os principais envolvidos para realmente gerar uma mudança, mas que acreditamos ter o poder de resolver sozinhos.
Se houver reflexão profunda a partir de uma influência externa e, após, uma ação complementar, aí sim haverá movimento.
Não é como se não pudéssemos influenciar mudanças de maneira positiva com nossas ações e palavras. Nós podemos. Acontece que temos menos influência na decisão alheia do que imaginamos. Nosso esforço não passa de um zumbido no ouvido de quem é responsável direto pela ação em si. Seja uma opinião, uma ideia, uma situação, todos os envolvidos precisam compreender e realizar primeiro em si.
Construímos narrativas mentais advindas de crenças impostas, relacionadas ao merecimento, as quais nos transformam em eternos buscadores de sucessos impossíveis. Esforçar-se em situações maléficas para o próprio bem estar não é persistência, é teimosia.
É preciso parar para analisar se o que se vive é de fato persistência ou se todo nosso esforço tem acontecido por teimosia por que, a longo prazo, ações teimosas tendem a ser prejudiciais não só para si mesmo, mas para todos ao redor.
Analisar os reais motivos que nos mantêm em uma situação difícil é o caminho mais seguro para entender o que se vive. Se os motivos estiverem conectados a si e aos próprios objetivos, eles são verdadeiros; se envolverem a necessidade de compreensão e ação de terceiros, é necessário repensar porque, provavelmente, estamos falando de teimosia. Nossa dureza em relação à mudança nos torna indivíduos mais teimosos. Às vezes, só precisamos desistir de bater de frente buscando manter-nos estáticos e soltar.
Tem coisas que não são nossas e que precisam ser deixadas para trás para que seja possível seguir em frente.
Talvez a maior sabedoria da existência esteja em utilizar a própria energia com coisas verdadeiramente construtivas. O tempo é finito e precioso e é importante escolher bem como utilizá-lo para que não haja arrependimentos futuros e medo da morte; uma vida sem teimosias, seguindo a fluidez da vida, buscando uma existência mais leve e plena.
O que não é nosso não vem até nós, independentemente do esforço.
O que é nosso sempre vem até nós, desde que estejamos presentes e atentos o suficiente para não perder de vista o que realmente importa. E o que realmente importa enche nosso viver de amor.
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