Começar é o mais difícil, mas talvez seja sobre isso
- Ana Luísa Vahl Dias
- 23 de abr. de 2021
- 3 min de leitura
Atualizado: 12 de mar. de 2024
Como começar tendo tantas incertezas e estando tão confortável, afinal? A vida moderna nos engole a cada dia porque a cada dia nos tornamos parte da engrenagem que nos ensinaram ser a vida.

Por algum tempo, enquanto eu crescia e amadurecia, fui esquecendo de escrever. Comecei a guardar diversas poesias só pra mim e muitos sentimentos, que antes se traduziam em palavras, começaram a acumular em gavetas de escrivaninhas em desuso.
Aos poucos, fui me desencontrando de mim e, num passo em descompasso, não visitei mais minhas poesias diárias, o que, de fato, refletiu diretamente no meu olhar para com o mundo.
Em um certo momento, ao me reencontrar com um caderno ávido por me ouvir, comecei um longo processo de reconexão e recomeço e, passo a passo, de palavra em palavra, o universo me lembrou de diversas coisas que eu não via há anos; a poesia retornou com ainda mais força que, antes destrutiva, tornou-se a força matriz de acreditar, outra vez, na poesia que o mundo é, em sua pureza essencial. A partir daí, uma vontade de seguir meu propósito se instalou, mesmo que eu ainda não entenda bem o que essa sensação - a qual chamo carinhosamente de propósito – possa ser, em seu âmago. As palavras fazem com que essa sensação tome totalmente o ambiente no qual me encontro e faça com que eu me sinta parte pertencente do universo, tornando-me ele em cada parte. Veio, então, em forma de sensações e percepções, a ânsia de escrever e compartilhar as reflexões que me acompanham desde que me lembro de refletir. Reflexões essas que criticam a vida moderna que nos engole a cada dia, mas que, em outros momentos, dança em meio à poesia existente em cada instante dessa mesma vida moderna. Então aflição, ansiedade e todos esses sentimentos que fazem parte do começo; fazem parte da ação relativa a sair da inércia; atrito.
Como começar tendo tantas incertezas e estando tão confortável, afinal? Começar é o mais difícil, mas talvez seja sobre isso. A vida moderna nos engole a cada dia porque a cada dia nos tornamos parte da engrenagem que nos ensinaram ser a vida.
Quanto mais nos aproximamos da perfeição em relação a essa engrenagem, mais nos afastamos do frio no estômago, da tensão em mudar, do atrito proporcionado pelo movimento que faz o coração acelerar. E é aí que a gente desacostuma a começar e esquece que, na verdade é, sim, sobre isso. A vida é movimento; é o passar do tempo que, no final das contas, é contínuo e circular; é o acordar todo dia pensando em como se desafiar e, de fato, exercer nosso verdadeiro potencial de seres humanos criadores e evolutivos. Ouso dizer que, sem essa sensação de atrito, não podemos nos colocar numa posição de vivenciadores da vida, visto que a vida é, de fato, desafiadora. Temos, em média, 80 ou 90 anos para nos desafiarmos e entendermos quem somos e por que somos. Quanto antes a gente entende que, pra isso, precisamos dos começos difíceis e desafiadores, antes a gente aprende a arte de viver e mergulha na poesia que é a vida. Então, sim, é sobre isso e eu, uma mera manipuladora de palavras, inicio meu começo com quem me lê e espero que, mesmo que minimamente, as minhas reflexões sobre a vida moderna causem reflexões calorosas e poéticas nos começos pelos quais cruzarei. Afinal, também é sobre isso.
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